sexta-feira, 12 de outubro de 2007

Paris, parte II: êita povinho estranho!!!

Iniciei falando do nosso primeiro obstáculo, que foi o francês-língua. Agora vamos ao francês-povo, esses não foram de forma alguma um obstáculo à adaptação, mais conhecê-los e aprender de suas peculiaridades, foi essencial para a melhor convivência.
Entender a história francesa é entender a França hoje. E haja história! Paris a reflete em toda parte, seja no muro que a cerca, seja no mêtro de 107 anos, seja no Louvre (e sua mescla o moderno e antigo), seja no apartamento da Tânia e Bel (com seu gás de 1922), enfim aqui tudo é velho. Imagina que há relatos de habitação no lugar de Paris há 40.000 anos. Mas a origem mesmo, veio em 250 a.c. quando os Parisii, povo Gaulês, iniciou o povoamento local (daí o nome). Sempre fazemos uma comparação, e lembramos que em 1500 as 13 caravelas portuguesas avistaram somente o Monte Pascoal com seus tupis e tapuias. Aqui na mesma época eles viviam a o período renascentista na arte , da arquitetura, a reforma protestante, a reforma política... Voilá, estamos no velho mundo!

Paris era somente a ilê de la cité. Foi murada para proteção em uma época que era impensável achar que a cidade ultrapassaria tais limites. O muro continua lá, paris continua cercada e limitadíssima. E o que fazer com uma população que só faz crescer? Se mude para o BANLIEUE. São pequenas cidades suburbanas q rodeiam Paris. Lá os imóveis são maiores, mais baratos, o mêtro te leva a qualquer parte de Paris em 30min e não há trânsito. Pra termos uma idéia, paris abriga 2.150.ooo habitantes. Os outros 9 milhões estão espalhados nestas regiões. Quer morar em Paris? Pague o preço. Qualquer 20m carré aqui é luxo. Nós moramos em 23m, temos amigos que moram em 12m. Se falar o preço nenhum brasileiro vem pra cá, mas imagine que em média você pagaria 1500 reais de aluguel em um studio de 15-20 metros quadrados. Não há espaço em Paris. O trânsito virou caótico (nada que se compare a uma marginal em dia de chuva), até os carros tiveram que se adaptar e diminuir o tamanho, ou serem substituídos pelas motos (são muitas) ou bicicletas.

Nossa casinha. Calma, nos 5m restantes ainda tem cozinha e banheiro

O SMART, fomos feito um para o outro...


Acho que a pequenice das moradias leva o francês a curtir mais as áreas externas, deve ser daí a origem do gosto pelos piqueniques, a bela manutenção dos parques, as piscinas publicas lotadíssimas, os bistrôs animados.Mas com uma ressalva, nada demasiadamente noturno, aqui tudo acaba cedo. Respeite a hora do metro pra voltar pra casa.


Política: Uma característica francesa marcante é a divisão do poder entre um presidente, que tem sob sua responsabilidade as relações exteriores e a defesa da nação, e um primeiro-ministro, que cuida de todo o resto. Essa mistura tão francesa de presidencialismo com parlamentarismo, inventada por Charles de Gaulle, funcionou bem, sob a batuta de presidentes carismáticos como François Mitterrand, socialista, que reteve durante 14 anos uma autoridade quase monárquica enquanto o conservador Jacques Chirac comandava o Parlamento. Este é um país onde o governo fica com mais da metade das riquezas produzidas, e ainda assim gasta mais do que arrecada. A palavra aqui é SUBSIDIAR. A França garante a saúde de seus habitantes do berço à UTI, educação gratuita e até subsidia as refeições nos bistrôs, para evitar que os botecos tradicionais sejam engolidos pelo fast food americano. Aqui o governo é mãe, e não é só na saúde ou educação, é ele que concede a babá pro novo membro da família, o material escolar, a faculdade... Além disso é o maior empregador do País, tudo dentro de um contexto tentador: jornada de trabalhode 35 horas semanais, o salário mínimo de 1.450 dólares, as férias são prolongadas e a aposentadoria precoce (60 anos). Sugiro assistir o novo documentário do Michael Moore (SICKO) que exemplifica maravilhosamente o que queremos dizer.



Paris tem uma prefeitura que reflete todo esse cuidado francês. Os seus são muito bem cercados, os outros nem tanto. Nós não podemos no queixar... O Julio nos sustenta com uma uma bolsa-de-estudos francesa ,almoça banquete a três euros em restaurante subsidiado, eu faço um curso de frânces SUBSIDIADO pela prefeitura, estagio em hospital público recebendo alimentação e transporte pago pelo estado. Ou seja, estamos aproveitando da boa-vontade parisiense. Olhando superficialmente é um esquema perfeito, exceto pelo enorme buraco no Tesouro Nacional. Percebe-se que quem sofre as consequências não são os nascidos em berços tradicionais ou na classe média, mas os pobres, muitos descendentes de imigrantes do norte da África e do Oriente Médio, grupos que crescem no país a cada dia. Os respingos começaram a cair sobre os franceses na forma de revoltas - em 2005, lembram-se? a falta de emprego foi um dos principais motivos que levaram jovens marginalizados a queimar carros e prédios nos subúrbios de Paris. Acredito este ser o grande atual dilema francês: a imigração. Como se proteger sem segregar, como manter esse esquema sem excluir. Eles vivem isso diariamente, seja nos seus notíciarios, seja nos BOF escutados no metro e boulevares sempre que um estrangeiro não anda conforme a música... O mundo perfeito está sendo invadido.


Das peculiaridades francesas, me recuso a divagar sobre os estereótipos disseminados pelas outras nações, coisas do tipo, eles não gostam de tomar banho, são fedidos, grossos, odeiam estrangeiros... Queremos falar de outras percebidas nesse tempo. Destaco uma que amo, a POLITESSE. São tantos monsieur, madame, vous , c'est gentil, excuse moi, mercis. Eles valorizam isso como ouro. Nas escolas de língua somos constantemente doutrinados a não fugir a regra e manter a politesse em tudo, nos tutoyer (em vez de vous usar o tu) apenas para os amigos mais íntimos.


Outra característica local, são os persistentes resquícios provincianos que insistem em permanecer e guerrear com a modernização local. Percebemos isso no mês de Agosto, o mês das grandes férias parisienses. Paris fica entregue as moscas (e aos turistas que lotam a cidade). Todo mundo viaja. As padarias fecham, alguns supermercados, lojas e lojas, encontrar um lugar pra revelar foto foi um custo (em pleno mês que registra-se o maior número de turistas). Eles não ligam, férias são férias... Aqui não existem coisas como supermercado 24h, ou aberto aos domingos. As lojas seguem seus horários religiosamente, mesmo se vc estiver na fila pra pagar, terá que voltar outro dia. C'est fermé!!! Talvez seja daí a fama de bons vivants (não muito adeptos das atividades laborativas). Existe ainda o fato do banco demorar pra registrar uma movimentação, o extrato de hoje só revela os gastos que foram realizados 3 dias atrás, a luz é medida duas vezes ao ano, o almoço dura duas horas....

Bom, Ça c'est Paris, 'melange' de cultura, tradição, arte, poesia.... conflituosamente uma cidade apaixonante.

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